Mesmo antes da Doença de Parkinson chegar, eu era e sou um
andarilho contumaz a com a chegada da DP
faço do andar um momento de paz,
de felicidade, de soberano de mim mesmo, vou caminhando
com prazer, sentindo cada passo,
cada árvore-folhagens-flores,do céu cinza-azul
de cada aroma que escapa pelas frestas das casas, hummm!
" Hoje ela caprichou na torta de maçã"
revela o aroma de maçã-açúcar-canela, em
outra casa, opa!! A dona de casa deixou a carne
assada passar de assada para chamuscada!!
Na esquina seguinte o padeiro caprichou no creme
com baunilha, na casa seguinte o cachorro reclama,
clama para ser liberto da corrente que incomoda
no pescoço, a mãe grita com o menino que
mais uma vez ele chegará atrasado na escola e como
reforço ao grito ela lhe aplica um cascudo e com
isso ela lhe dá ensinamentos de dever - de
hierarquia, de obediência aos mais velhos.
Caminho sempre apoiado em uma bengala que além
de marcar o passo, garantir que eu não caia
após uma topada, garantir que me cedam lugar
no ônibus, garante também que não seja rotulado
de embriagado-pau-d'água e outros nobres títulos,
mudando para: "ele é deficiente, é aleijado..."
E se estiver com óculos escuros "é cegueta".
Confesso que prefiro os nobres títulos!
Certo dia, após uma sessão de fisioterapia, voltando para casa
de ônibus superlotado (acho que superlotado é sinônimo de ônibus),
ao tentar descer, percebi que estava com as pernas paralisadas,
em"freezing"- congelamento, pedi então ao fino
senhor motorista que me ajudasse a descer e ele
delicadamente! "Sou motorista e não ganho para ser enfermeiro.
" Foi em frente com o ônibus do qual consegui
descer no ponto final. E todo ponto final é um
caos: ambulantes, pedintes, barracas de frutas e inúmeros
pontos de ônibus em um dos quais eu me
encontrava ainda sem poder andar pois a levodopa
que engolira, teimosamente não fazia efeito e eu zonzo,
agarrado a um poste chamava a atenção
dos ambulantes e eles acionaram
policiais que chegaram amáveis " documentos, é pó ou pinga
" Expliquei, dei aula sobre DP, medicamentos e,
após um telefonema ao chefe
cuja genitora tinha DP, fomos até o guichê da companhia
de ônibus que me trouxera até o ponto final,
e em reunião com o fiscal da linha
obrigaram a companhia a me levar em casa; e assim
lá fui: o motorista e seu único passageiro,
eu, em um ônibus particular.
5 comentários:
Bérgamo, vc é especial. Um ser humano interessantissimo, apaixonante. Feliz de nós que podemos conviver com vc com Parkinson. Grande beijo, Marcia Silveira Farah Reis
Bérgamo, vc consegue fazer a gente viajar com vc, sentir todos os aromas e ver todas as cores. Eu me senti uma rainha andando naquele ônibus particular!! Ah... e todos nós no Lótus ficamos sensibilizados pelo texto sobre a Gertrude, lembrando de como ela estava tão feliz lá na Cultura Inglesa, no final do ano. Bj!
Pai! Emocionada por aprender tanto em um poema, texto seu que expressa seu dia a dia! Que invencível você se torna a cada dia, convivendo com os muitos desafios para ser humano! Saber ser em cada situação é uma dádiva! Agradeço por seu exemplo de força felicidade e determinação! Amor Paz e Luz! Orgulho de ser sua filha!
Gostei dessa referência aos cheiros e a essa alegria que eles nos dão.
Quanto ao final da história... ainda há pessoas boas e gentis!
O resto é melhor esquecer...
~Um grande abraço amigo.
Adorei o texto que mais parece uma conversa. O que mais me fascina neste contexto é o teu bom humor que contagia. Essa é uma das lições que recebo de você meu querido amigo. É muito bom te-lo encontrado no encontro que nunca foi marcado, pelo menos por nós. Abraço bem forte com direito a 3 tapinhas nas costas sinceros.
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